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quinta-feira, 21 de julho de 2011

A Educação Superior no novo Plano Nacional de Educação - PL 8035/2010


Por Pedro Mara[1]

Há quase dez anos a sociedade civil brasileira mobilizava-se para aprovar um Plano Nacional de Educação que apontasse para universalização da educação, o que exigiria investimentos do poder público que viabilizassem as metas propostas. Paralelamente às exigências da sociedade brasileira em torno de uma democratização real do acesso à educação em todos os seus níveis, o governo FHC vetou a proposta de investimento de 10% do PIB pra educação. Com a eleição de Lula em 2002, com o apoio de setores conservadores e de uma boa parte das elites e oligarquias brasileiras, manteve-se o veto de 10%.

Entretanto, pelas características da sociedade politica e civil no Brasil, permeadas por relações clientelistas e patrimonialismo e de uma burguesia, o PNE não é visto como uma politica de Estado, e sim de Governo. Desta forma, o governo Lula ignorou o PNE aprovado e utilizou como referência para as politicas educacionais, dentro do qual estavam para educação superior propostas de reforma universitária que não condiziam com as bandeiras históricas da esquerda lutadora, entre os quais estavam o PROUNI, a Lei de Inovação Tecnológica,REUNI, entre outros. Ressalte-se que houve neste período um período de grande cooptação das entidades brasileiras (UNE, CUT, parte do MST, entre outras).

A bandeira de todos os lutadores sempre foi a aprovação de um PNE como politica de Estado, e não como politica de governo, mas as tensões que marcam as disputas politicas e correlações de força pelo poder no Brasil nos impõem que a luta não seja técnica-científica, mas sim politica, respaldada por um projeto para a classe trabalhadora brasileira.

Os próximos meses serão de intensos debates acerca da aprovação do Plano Nacional de Educação para o período 2011-2020. Trata-se das metas para educação na década. Partimos do principio de que a Educação Superior deve ser majoritariamente oferecida pela União e Estados em universidades públicas e se organizará com base na indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.

O atual projeto do PNE (PL 8035/2010), tal qual o anterior, é um projeto do Executivo, sem a participação da sociedade brasileira, pois desconsiderou o debate e as deliberações da CONAE – Conferência Nacional de Educação, que foi precedida por conferências municipais, regionais e estaduais, com um debate que embora com contradições, representou um avanço em termos de concepção de educação. Entre os eixos temáticos da CONAE podemos destacar de progressista o papel do Estado na garantia do direito à educação de qualidade; gestão democrática e avaliação; formação e valorização dos profissionais da educação; e financiamento da educação e controle social; justiça social, educação e trabalho, inclusão, diversidade e igualdade.

Entretanto, os 11 artigos, as 20 metas e 171 estratégias do PNE não sefundamentam em qualquer diagnóstico ou em uma avaliação do PNE de 2001- 2010, sobre possíveis lacunas que ficaram.

O atual PNE proposto pelo governo apresenta uma concepção de educação orientada pela lógica mercantilista, assentada no tripé: gestão (empresarial); financiamento(recursos públicos /setor privado) e avaliação (de resultados). Este tripé foi o que possibilitou grande parte da privatização (no setor público) e mercantilização (setor privado) da educação superior.

Ademais se destaca a construção/viabilização de um Sistema Nacional de Educação sem o qual as metas ou parte delas estarão comprometidas não aparece como objetivo.

A principal questão refere-se aos termos de financiamento, que não avança dos 7% do PIB propostos no PNE 2001-2010; no qual a concretização só seria possível ao fim de 2020.

Este PNE aponta para um avanço ainda maior da privatização nos dois extremos da educação: na educação infantil (E-1.4 oferta por entidades beneficentes /privadas) e na educação superior (via PROUNI, FIES, EAD).

Na meta 12do PL 8035/2010 a Expansão da educação superior é proposta na perspectiva de elevação da taxa bruta de matrícula na educação superior para 50% e a taxa líquida para 33% da população de 18 a 24 anos, assegurando a qualidade da oferta, otimizando a estrutura física e os recursos humanos das instituições públicas de educação superior para ampliar e interiorizar o acesso à graduação (REUNI) – E12.1

No item 12.02 a proposta é de ampliar a oferta de vagas por meio da expansão e interiorização da rede federal de educação superior, da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica e do Sistema Universidade Aberta do Brasil,(REUNI; EAD).

Outro ponto bastante polêmico refere-se à proposta do eixo 12.3 de elevar gradualmente a taxa de conclusão média dos cursos de graduação presenciais nas universidades públicas para 90% (noventa por cento), ofertar um terço das vagas em cursos noturnos e elevar a relação de estudantes por professor para 18 (dezoito) [2], mediante estratégias de aproveitamento de créditos e inovações acadêmicas que valorizem a aquisição de competências de nível superior. Estas propostas institucionalizam permanentemente os princípios presentes no REUNI e no modelo Universidade Nova/Bolonha.

Outro eixo que avança pra privatização refere-se à avaliação, expressa no eixo 13.2 e 13.3, cuja proposta é inicialmente ampliar a cobertura do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes - ENADE, de modo a que mais estudantes, de mais áreas, sejam avaliados no que diz respeito à aprendizagem resultante da graduação; tal qual induzir processo contínuo de auto-avaliação das instituições superiores, fortalecendo a participação das comissões próprias de avaliação, bem como a aplicação de instrumentos de avaliação que orientem as dimensões a serem fortalecidas, destacando-se a qualificação e a dedicação do corpo docente. Estas propostas avaliativas não se inserem no principio de avaliação que defendemos, que identifique problemas e possa fazer com o Estado injete recursos para resolvê-los, tal qual segue numa proposta de ranking para o setor privado. As auto-avaliações por si mesma devem apontar também não convergem para que se cobre do Estado mais recursos para as universidades ou um padrão de qualidade no setor privado.

É na parte de financiamento que voltam-se grande polemicas. Na contramão do Estado como financiador da universidade pública os eixos voltam-se para expandir o financiamento estudantil por meio do Fundo de Financiamento ao estudante do Ensino Superior - FIES, de que trata a Lei nº 10.260, de 12 de julho de 2001, por meio da constituição de fundo garantidor do financiamento de forma a dispensar progressivamente a exigência de fiador.

A propostaatual do PNE pode ser considerada muito mais ultrapassada que a anterior. Se no anterior a proposta era elevar em níveis de 30% o acesso à educação superior pro período, até 2010, neste a proposta é absurdamente maior e continuamos com a mesma cifra de parcos recursos pra educação. Este PNE vem a ser mais uma peça no quebra-cabeça historicamente de desestruturação da educação no nosso país. E contra este processo os lutadores devem unir-se, demonstrando que as metas de elevação dos indicadores educacionais no país só serão possíveis se houver investimento público, se a gestão não for orientada para resultados quantitativos – o foco deve ser a qualidade e se a avaliação tiver capacidade de identificar os problemas e exigir recursos do Estado para a solução destes.



[1] Estudante de Ciências Sociais da Universidade Federal do Para, ex-secretario geral do DCE UFPA, ex-conselheiro discente no CONSUN UFPA

[2]A relação professor-aluno na rede pública é de 12,38 e nas IES privadas é de 20,34. Neste sentido observa-se uma tendência de alinhamento das IES públicas aos padrões privados.

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